O País está, vertiginosamente, a abandonar a canoa da esperança depois desta ter dado a sensação de emergir da letargia e vícios partidocratas (implantados desde 1975). Depois de ter saído da doca seca, onde supostamente foi sujeita a uma reparação meticulosa, a canoa começou a meter água por todos os lados.
Por William Tonet
Ao que parece, os especialistas do estaleiro do MPLA taparam os buracos da embarcação anterior com material que retiraram de outras partes… fazendo novos buracos. Dir-se-ia que a estratégia foi a de, como agora se vê cada vez mais, ir de buraco em buraco até à cratera final.
Infelizmente, até os mais ousados e destemidos navegadores, reconhecem terem sido traídos pelo optimismo de mudança, com a simples transição. Todos se deixaram embalar, seduzir e enredar na narcolepsia das promessas vãs, tal era a beleza propagandística da velha embarcação que, retocada e embelezada com papelão e visgo, parecia ser um navio capaz de atravessar, em segurança, as águas mais revoltas.
O país está não só a naufragar como a tombar no pessimismo, tal é a desilusão de todos os que, cansados de uma longa noite de 38 anos, julgaram ver num errante vaga-lume um potente holofote capaz de dar luz a uma tenebrosa escuridão. Foram traídos pela ilusão óptica e pela incapacidade de ver que tinham à sua frente não uma gira fã mas, apenas e só, uma girafa igualzinha a tantas outras que já conheciam.
Muitos dos que auguravam com chapadas no peito, um novo oxigénio na discriminatória tribo política dominante, estão hoje divididos se a opção do comandante é a PAZ ou a GUERRA. É uma dúvida existencial que, desde logo, pode fazer germinar as sementes que arrasarão a nossa própria existência enquanto país independente gerido por angolanos. É sério o risco de esta paz trazer mais descalabro do que qualquer guerra. De facto, não adianta falar de paz ao mesmo tempo que se compram armas e se escancaram as portas para a colonização económica, numa clara violação a soberania angolana.
Estes generais da vigésima quinta hora estão a destruir as bases, já de si débeis e de desgaste acelerado, da construção de um país, para prender o “staff” de um homem, José Eduardo dos Santos, condecorado, idolatrado até à exaustão, num cinismo, afinal abjecto, antes da sua saída do palanque. Inclusão e reconciliação é exactamente o oposto de tudo isto. Isto não passa de uma tentativa, bem programada, para provocar a implosão de uma sociedade que, pela mão dos seus políticos, está a “contratar” dentistas e oftalmologista quando sabe que eles não são necessários porque, nesta mais do que provável técnica de olho por olho, dente por dente, vamos ficar todos cegos e desdentados.
Se JLo queria prender e mandar para a sarjeta todo o consulado do MPLA e República de José Eduardo dos Santos, porque se prestou ao triste papel de o condecorar, como presidente emérito do partido governante? Porque o venerou e idolatrou perante os angolanos e perante o mundo, ao receber o cajado de líder do MPLA?
A hipocrisia, já para não falar da falta de seriedade moral, deveria ter limites. A vergonha também.
Os estadistas não são aqueles que exibem títulos de Presidente e de Titular do Poder Executivo. São os que vivem para servir, com honra. Se JLo quis mesmo combater a corrupção do ontem, institucionalizada pelo partido que hoje dirige e no qual aprendeu tudo o que sabe, para o bem e para o mal, e lhe garante retaguarda, e não cuidou de restaurar a norma jurídica e os caboucos farinhentos da justiça, é porque está no galho errado, é porque se julga um corredor de fundo quando, na verdade, é um sprinter que não sabe ir além do fundo do corredor do poder.
Não adianta dizer a tudo do ontem da “nossa cumplicidade” não, não, não… quando o dever é o de se avançar com propostas ousadas, sublimes e patrióticas, sugerindo alterações e reformas dos paradigmas nocivos, apelando à participação de todos actores, numa primeira e verdadeira Assembleia Constituinte de Angola, para se esboçar um verdadeiro projecto país, baseado na moral e ética das várias sensibilidades da interioridade dos vários povos, que habitam o território Ngola.
Ao defendermos que JLo deveria optar por ser salvo pela crítica e não ser assassinado, mesmo que com uma dúzia de condecorações ao peito (tal como JES), pelo elogio, estamos a dizer que só a verdade cura, por muita dor que cause no momento. Pena é que o Presidente se rodeie quase só de sombras. É claro que estas estão sempre de acordo com ele. Será mesmo isso que ele quer? Veja-se como não condenar a actual opção de combate à corrupção, limitada à visão do novo líder, que não abdicou de nenhum poder antes blindado em JES, pelo contrário aumentando os seus poderes pessoais, com a centralização de todas as decisões e excluindo os consensos, inclusive no interior do próprio partido.
Um Governo de um país não pode ser uma sociedade unipessoal. E é isso que acontece. E quando isso acontece, já não falta nem um passo para se chegar ao átrio da ditadura. O discurso em dois anos não passa de tentativas vãs de convencer a sociedade internacional (a nacional está mais preocupada em arranjar comida) de que a sua suposta luta contra a corrupção é o único elixir de que o país precisa e o mundo carece para cá despejar toneladas de dinheiro fiado.
Ledo engano, obviamente. JLo foi ousado no início mas ao implantar uma política de intimidação e terror, não consegue ter contribuições válidas que possam escapar ao ferrete da bajulação, à regra de dizer o que o chefe quer ouvir, ao paradigma de que entre um génio que não seja do MPLA e um néscio que seja, se escolha (pois claro) o… néscio.
Veja-se um caso que deveria levar à queda do governo, o estado de degradação da Avenida do Calema II. Uma estrada esburacada, com poças de lama, crateras que é a imagem de marca de quem (des)governa (ou se governa), ladeada por milhões e milhões de dólares, que intimidados nada fazem, quando tudo poderiam ajudar, para acabar com aquela pouca vergonha. Quem ladeia a pouca vergonha são armazéns repletos de mercadoria, logo, não se pode falar de falta de recursos, no orçamento e a simples avocação destes, tresanda a mera incompetência governativa, porquanto se estes (armazenistas) pagam impostos regulares, era levá-los a transferir, por exemplo, num dado momento, 30% aos cofres públicos e os restantes serem empregues na reabilitação e manutenção de uma nova e boa estrada, que feita iria reduzir, o paludismo e outras doenças causadas pelas águas putrefactas, também elas paradigma de sucessivos doutoramentos em incompetência.
JLo quer colocar-se como o novo Messias de Angola o único juiz que chega até Deus (se é que não pensa ser ele o próprio “Deus”) e… conseguiu em menos de dois anos o mérito de todos, por exemplo, no próprio Comité Central do MPLA deixaram-no a falar sozinho (uma vantagem para quem se julga dono da verdade). Deixam-no ser jogador e árbitro, com palmas cínicas, mas sem amor e paixão no que fazem. E quando assim é, o protagonista já morreu… só que ainda não sabe.
Veja-se o facto de JLo não se importar com a flagrante violação a Constituição, a lei dos partidos políticos e eleitoral, com a realização do 7.º Congresso Extraordinário, ao projectar a tomada de decisões vinculativas; aumentar o número de membros do Comité Central, alterar os estatutos, entre outros actos, que configuram um atentado às leis…
Paradoxalmente, alertado, na própria reunião do Comité Central, com o recurso a norma jurídica, ele amarfanhou a lei, deitando- -a ao tambor do lixo, com a seguinte expressão: “Mas isso já foi visto e alguns camaradas disseram não haver problema”.
Mentira! Nada de mais falacioso, pois a lei é imperativa, os congressos extraordinários não podem ser vinculativos, eles resumem-se a tomada de medidas descritivas do ponto de vista político, para passarem a normativos partidários nos congressos ordinários, tribuna para alterar estatutos e programa, o resto é demonstrar a céu aberto o carácter estruturante e transversal da fraude, por parte do partido e actores deste, no circuito dos órgãos do Estado.
E, com isso, fica demonstrado nunca em Angola haverá eleições verdadeiramente livres e justas sem fraude, pois se entre e no seio do MPLA essa é a imagem de marca, com os demais actores é o ADN da lógica da batata na lei da batota.